Por Benjamim Teixeira (Esp. Eugênia)
(B) – Eugênia, seria abusivo perguntar sobre masturbação?
(E) – A forma de me perguntar já revela a necessidade de se ventilar a temática. Claro que sim. Tudo deve ser falado, sob a perspectiva da Espiritualidade, principalmente o que é foco de tabu, porque, então, os automatismos neuróticos e destrutivos, bem como as fixações culturais e sociais, agem mais livremente a prejuízo de comunidades e indivíduos.
(B) – No passado, Eugênia, tratava-se a masturbação como pecado ou como desequilíbrio que até poderia causar distúrbios mentais e físicos. A medicina (auxiliada pela psicologia e pela sexologia) eliminou os fundamentos de tais crendices populares (que tiveram muito apoio de gente instruída, em tempos idos), mas, no meio espírita, ainda se considera a masturbação, como vampirismo ou desvio de função das energias sexuais, um desperdício, qual se todo ato masturbatório indicasse uma queda em tentação. Poderia nos falar algo sobre estas considerações?
(E) – Sim. É gritantemente necessário que o postulado básico de acompanhar a ciência seja lembrado entre aqueles que desejam, sinceramente, desposar o Espiritismo como filosofia de vida. Apegar-se a velhos conceitos, por tradição, por medo de enfrentar o novo ou por receio de ser plenamente responsável pelos próprios atos, é de tal modo descompassado com a modernidade, que nos eximimos de expender mais comentários a respeito. Importante lembrar que médiuns acabam filtrando, inconscientemente, o pensamento das entidades que se manifestam por seu corpo mental, de modo que refrações sutis e graves podem se dar (e se dão sempre, em algum nível). Eis por que a vigilância deve ser acentuada, sobremaneira quando condicionamentos culturais e convenções muito cristalizadas estão envolvidos.
O que tem dito a ciência sobre o assunto? Que a masturbação é algo natural e até desejável para o indivíduo adulto; e que, mesmo entre aqueles que já têm a vida afetiva disciplinada nos corredores da educação conjugal, é compreensível aconteça o fenômeno do onanismo (para os dois gêneros), que se revela mesmo imperioso, amiúde, quando os ritmos sexuais dos parceiros não se alinham, a fim de que um não incomode o outro na satisfação de suas necessidades de fundo psicofisiológico, nem alguém se frustre na quota de libido que lhe não seja possível imediatamente canalizar para atividades não-sexuais, sem gerar recalques indesejáveis.
Seja na tenra idade, seja em idade avançada, para solteiros ou casados, hétero ou homossexuais, o fenômeno masturbatório pode ser comparado à ida ao banheiro para a excreção dos detritos alimentares. Há abusos, sem dúvida, como os há em tudo na existência humana. Os ritmos sexuais podem ser exacerbados, na compulsão, ainda que se não tenha parceiro para a prática. Cada caso é um caso, e, somente com profundo autoconhecimento, a criatura descobre o sistema apropriado ao seu modo de ser, em função do bem-estar geral, da produtividade, da criatividade e do sentimento de equilíbrio íntimo, que constituem alguns dos resultados da vida sexual resolvida.
Quanto ao vampirismo, pode acontecer também na vida afetiva a dois, sempre que os desajustes da perversão e da promiscuidade invoquem, para a alcova do casal, presenças extrafísicas de baixo calão vibratório, pelo próprio diapasão de desequilíbrio em que se expressam em seu momento de intimidade.
(B) – Que bom, Eugênia! Creio que estas suas colocações esclarecedoras vão ajudar muitas pessoas. Entretanto, você aludiu a “perversão”, e este conceito me parece muito amplo e difuso, pelo mesmo motivo de os preconceitos adentrarem este departamento valorativo. Temos muita dificuldade em aceitar e conviver com nosso lado animal, e muitos são os que têm vergonha e não se soltam em funções elementares de sua própria fisiologia, tudo tendo como sinal de depravação, primitivismo e imoralidade. O que você quis dizer por “perversão”? Digo, porque, inclusive, na temática “masturbação”, está em jogo, normalmente, o fator “fantasia”, que pode incluir itens que não sejam desejados também na relação concretizada a dois – estou certo?
(E) – O tema é muito complexo, e, sem dúvida, não o esgotaremos nesta nossa primeira fala a respeito. Por outro lado, não somos autorizados por Nossos Maiores, ainda, a discorrer abertamente sobre o assunto, porque mentes menos amadurecidas, levianas, despreparadas para nos ouvir, poderiam fazer mau uso de nossas afirmações. O que podemos dizer é que tudo que lese física, emocional ou moralmente alguém pode ser enquadrado no capítulo “perversão”, ao passo que tudo quanto promova o bem-estar biopsíquico, o crescimento psicológico e a boa relação entre as criaturas não pode ser considerado como distúrbio moral ou patologia psíquica.
O quesito “fantasia” é ainda mais intrincado, porque, freqüentemente, melhor que se liberem certos conteúdos indesejados (e ainda não de todo domesticáveis) da psique, por meio das ferramentas imagéticas, do que fazê-los colapsarem no próprio comportamento, em surtos que se chamam, em psicologia junguiana, de “possessão pela sombra” (*). Os princípios de civilização, entretanto, devem sempre reger tais processos mentais, na promoção da educação e da melhoria progressiva dos indivíduos, dos mais ínfimos aos maiores gestos, dos mais secretos aos públicos. A gerência de tais impulsos – que, como disse, não podem, em sua totalidade, ser de pronto sublimados – corre por conta da responsabilidade de cada um, em função do próprio e do bem comum.
(B) – Algo mais desejaria dizer, por ora?
(E) – Que se procure, em tudo, o ponto de vista do bom senso, do equilíbrio, da visão de conjunto, e dificilmente se incorrerá em erros graves de conduta, seja consigo mesmo, seja nas relações interpessoais.